125 anos de Fernando Pessoa | Jane Tutikian
No dia da comemoração dos 125 anos de Fernando Pessoa a CLL entrevistou a professora Jane Tutikian. Tutikian é pós-doutora em Literatura, professora e atual Diretora do
Instituto de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(Ufrgs), além de membro da Academia Rio-Grandense de Letras. Confere aí nossa conversa sobre o grande mestre!
CLL - Podemos dizer que hoje são 125 anos do maior poeta da Língua Portuguesa?
Jane Tutikian - Sem qualquer dúvida. Fernando Pessoa foi um
gênio, um excesso, um poeta múltiplo, vários em um e um em vários. Foi o
poeta da totalidade fragmentada, o fingidor, o mistificador, o produtor de
vanguardas. Foi o nacionalista místico e o sebastianista racional. Foi o poeta
dramático, o poetodrama, como disse Seabra e, a parte isso e muito além disso,
" muitas outras coisas".
Nenhum poeta , em língua portuguesa, foi maior e mudou tanto a literatura de um país como ele.
Na verdade, como disse Ferreira Gullar, pela complexidade e
pela beleza, Fernando Pessoa deu um novo sentido e um novo peso não
apenas à poesia, mas à literatura de língua portuguesa.
CLL - Fernando Pessoa continua sendo atual?
J.T - É assim com a verdadeira arte, transcende barreiras, vence os tempos. Fernando Pessoa continua sendo atual e continuará sendo sempre, porque, a par da inovação estética que reformulou o código poético português, Pessoa, na busca de si mesmo e na busca de uma razão maior para a vida e da verdade absoluta, terminou revelando a alma humana, seja no mestre Caeiro, este " argonauta que traz ao universo um outro universo" ,no que tem de inocente e na forma como discute a felicidade ( no aprender o desaprender do pensar que lhe foi ensinado) na simplicidade absoluta da natureza, que existe sem pensar.
Como não chorar lendo a Ode N° 8, em que o Menino Jesus vem à terra?, seja através do falso equilíbrio de Reis, seja no total desequilíbrio de Campos, que quer sentir tudo de todas as maneiras.
Interessante colocar aqui que Fernando Pessoa, apesar dos
125 anos, não esgotou. Deixou uma arca com mais de 24.000
papéis escritos, uns datilografados, outros não, uns atribuídos aos
heterônimos, outros não, a descoberta de mais de cem personalidades
literárias...e nem tudo foi ainda estudado e nem tudo foi ainda revelado ao
grande público.
CLL - Quais seriam os exemplos do poder da poesia de Fernando
Pessoa? Ela tem forte influência na literatura e cultura brasileira?
J.T. - Fernando Pessoa revolucionou a poesia e a literatura de um país pacato e provinciano como Portugal. Depois dele, a poesia jamais foi a mesma. No Brasil, os diálogos com Pessoa são intermináveis, comecemos pelo nosso poeta maior- Drummond- que explica a teoria do fingimento ao modo brasileiro em A Rosa do Povo, até o carregar o mundo, nos ombros, como o poeta brasileiro, ou nos sonhos, como o poeta luso. A própria narrativa brasileira dialoga com Pessoa, tomemos, como exemplo, já que estamos falando dos grandes, aquela que para mim é a grande escritora brasileira do século XX, Clarice Lispector. Todo o sensacionismo pessoano tem eco na obra de Clarice, no próprio estar no mundo de Clarice.
CLL - O poeta João Cabral de Melo Neto uma vez afirmou: "O
mal que Pessoa fez à literatura é imenso. Aquela coisa 'inspirada', caudalosa,
criou uma legião de poetastros que acreditam na inspiração metafísica. Até
Drummond ficou assim no fim da vida". A professora concorda com isso?
Fernando Pessoa continua causando polêmicas no meio literário?
J.T. - Não, não concordo. Estudo Fernando Pessoa há 20 anos,
mas, talvez não tenha lido o mesmo Pessoa que João Cabral de Melo leu. Quem
dera o nosso poeta racional tivesse tido um pouco da genialidade da
racionalidade de Fernando Pessoa, e ele também foi sensacionista,
quem dera...
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