Amor em capítulos
Hoje é Dia dos Namorados para os brasileiros. Os casais festejam nacionalmente no dia 12 de junho (por ser véspera do Dia de Santo Antônio, santo casamenteiro - casais de porto-alegrenses devotos podem visitá-lo na Paróquia Santo Antônio, que deu nome ao bairro da cidade) e, em 2012, em uma semana de temperaturas baixas, até o sol apareceu para alegrar o dia dos apaixonados e aquecer corações. O amor é um tema consagrado na escrita mundial - e por isto, nesta tarde ensolarada, vamos fazer uma breve retrospectiva de como este sentimento procurou ser retratado na história da literatura nacional.
O primeiro documento escrito relacionado ao Brasil foi a carta de Pero Vaz de Caminha sobre a chegada dos portugueses à terra brasileira. O amor não se encontra como tema abordado no documento, sendo curiosa apenas a postura dos colonizadores ao observarem, fascinados, as "vergonhas" expostas da população nativa.
Gregório de Matos, poeta barroco e satírico, criou sua própria definição (contrastante com os autores românticos que surgiriam no futuro) de amor:
O Amor é finalmente
Um embaraço de pernas
Uma união de barrigas
Um breve temor de artérias.
Um embaraço de pernas
Uma união de barrigas
Um breve temor de artérias.
Uma confusão de bocas
Uma batalha de veias,
Um rebuliço de ancas
Quem diz outra coisa, é besta.
Tomás António Gonzaga, poeta árcade luso-brasileiro, evocava a musa Marília para seu nome arcádico, Dirceu, cantando seu amor à figura de uma amada ideal:
As fortunas que em torno de mim vejo,
Por falsos bens que enganão não reputo;
Mas antes mais desejo,
Não para me voltar soberbo em bruto
Por vêr-me grande quando a mão te beijo.
Graças, ó Nize bella,
Graças á minha Estrella!
Por falsos bens que enganão não reputo;
Mas antes mais desejo,
Não para me voltar soberbo em bruto
Por vêr-me grande quando a mão te beijo.
Graças, ó Nize bella,
Graças á minha Estrella!
(Trecho da Lira V de Marília de Dirceu)
A maior parte dos autores românticos enxergavam o amor como um sentimento impossível de controlar, puro e imprevisível, emblemático do "amor à primeira vista". É o caso dos personagens de José de Alencar, nos quais o amor brota e nunca morre, tornando o apaixonado um fiel héroi para a pessoa de sua afeição.
O realismo expunha personagens mais complexos psicologicamente. A paixão é mostrada com diversos aspectos ignorados pelos românticos, e surgem os complicados relacionamentos de casais da literatura brasileira, como é o exemplar caso de Bentinho e Capitu, do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis.
O modernismo, cujas propostas estavam preocupadas com a abolição das regras consagradas no fazer literário, já inaugura (de forma mais completa, pois nenhum movimento pressupõe uma unidade no tratamento de qualquer assunto - há diversas retratações do amor em todas as escolas literárias, mas algumas retratações foram mais recorrentes do que outras) a pluridade no tratamento do assunto "amor" na literatura brasileira. Mesmo assim, como maneira de demonstrar um pouco da produção modernista, tão admirada até os dias de hoje, escolhemos o poema Amar, de Mário Quintana:
Amar:
Fechei os olhos para não te ver
e a minha boca para não dizer...
E dos meus olhos fechados
desceram lágrimas que não enxuguei,
e da minha boca fechada nasceram sussurros
e palavras mudas que te dediquei...
O amor é quando a gente mora um no outro.
Fechei os olhos para não te ver
e a minha boca para não dizer...
E dos meus olhos fechados
desceram lágrimas que não enxuguei,
e da minha boca fechada nasceram sussurros
e palavras mudas que te dediquei...
O amor é quando a gente mora um no outro.
A literatura brasileira contemporânea é tão farta e plural que é difícil analisar o tema do amor. Existem escritores que tratam quase exclusivamente do tema de amor romântico. Outros, quando escrevem sobre amor, fazem-no de maneira com que fique a cargo do leitor entender (ou interpretar) que se está falando sobre paixão. Seria, talvez, uma atitude estranha presentear o (ou a) amado(a) com o trecho de poema abaixo, de Paulo Scott:
hoje fui atacado por uma dessas aranhas-gota
são animaizinhos que se alimentam da respiração humana
descem pelos azulejos, aí saltam, picam no pescoço
(geralmente atacam em dupla)
e sobem rápidas para o couro cabeludo,
a vítima tem menos de um minuto
para se ajeitar na posição horizontal,
é a única forma de aplacar a dor
que se alastrará pelos globos oculares,
procurá-las é inútil, desista, elas cavalgarão na sua cabeça,
a paralisia durará meia hora,
você não adivinha a saudade que me veio
quando o efeito do veneno passou
são animaizinhos que se alimentam da respiração humana
descem pelos azulejos, aí saltam, picam no pescoço
(geralmente atacam em dupla)
e sobem rápidas para o couro cabeludo,
a vítima tem menos de um minuto
para se ajeitar na posição horizontal,
é a única forma de aplacar a dor
que se alastrará pelos globos oculares,
procurá-las é inútil, desista, elas cavalgarão na sua cabeça,
a paralisia durará meia hora,
você não adivinha a saudade que me veio
quando o efeito do veneno passou
(trecho de Ainda o movimento para o primeiro amor)
Mas, daí, cada casal é um casal diferente. E existe muita literatura, de modo que os casais podem escolher com qual autor preferem passar (ou que escritor escolhem citar durante) o Dia dos Namorados.
Quem quiser escrever declarações românticas, pode encontrar aqui diversas sugestões de poemas para colocar no cartão de amor. Quem quiser a lista da CLL de cinco casais marcantes da literatura, pode conferí-la aqui.
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