Entrevista: Reginaldo Pujol Filho


Reginaldo Pujol Filho, escritor porto-alegrense, possui dois livros lançados (Azar do Personagem, de 2007, e Quero ser Reginaldo Pujol Filho, de 2010), organizou a antologia Desarcordo Literário e tem vários contos publicados em diferentes meios. O gaúcho, cujo último livro recebeu o Prêmio Açorianos de Literatura 2011 pela capa de Samir Machado de Machado, anda atualmente por terras lusitanas - e podemos acompanhar um pouco de suas experiências em terras estrangeiras pelos blogs do autor. A Coordenação do Livro e Literatura conversou com o escritor sobre sua última obra publicada, a utilização da internet para promoção da literatura, a influência da experiência em Portugal para possíveis livros futuros e o papel do campo publicitário em seu fazer literário:

CLL - De onde surgiu a ideia de "escancarar as influências" em teu último livro, "Quero ser Reginaldo Pujol Filho"? Cada tratamento direcionado para os autores homenageados no teu livro procura dizer algo quanto ao legado ou estilo destes escritores? Todo escritor, em certas ocasiões, 'quer ser' outro escritor?

R: Assim, a ideia de trabalhar as influências não sei bem dizer de onde veio. Mas, claro, tinha o conto do Amílcar Bettega e, logo depois dele, já com o Azar do Personagem (meu primeiro livro) fechado, me veio o Quero Ser Luigi Pirandello. Acho que com esses dois na mão comecei a pensar que tinha um conceito interessante de livro. Talvez dê pra dizer que foi assim, mas às vezes penso que toda história sobre como surgiu um livro vai ser sempre mais uma história do livro, né?

Sobre a segunda parte da pergunta, o tratamento de cada autor/conto dentro do livro, diz algo sobre esses autores em relação a mim, ao que eles significam ou significaram pra mim em um momento, no momento do livro. É possível que eu releia o Machado hoje e daqui a um tempo surja um novo Machado que eu posso representar num, digamos, Quero Ser Machado de Assis II. Mas, pro bem e pro mal, os contos lidam com a minha relação mais que pessoal, até passional, com cada um desses autores. Pode ter coisas que tu leu neles ou visões que já são lugares comuns sobre eles que eu não abordei, porque são coisas que não me tocam. E, quanto a todos os escritores “quererem ser”, é possível que sim, que seja assim. O normal é que a gente leia antes de escrever, digo, não sei se existe algum escritor no mundo que já escreveu um livro, um conto, um poema sem ter lido um livro, um conto, um poema antes. Claro, essas coisas não são objetivas, explícitas, tipo “ah, vou escrever porque quero ser o...” (algumas vezes até é), são mecanismos da cabeça de cada um. No meu caso a coisa foi mais radical (e nem por isso mais verdadeira do que se dá com outros autores) porque eu me propus um exercício, uma regra. Daí ser mais explícito do que ocorre em geral. Mas acho que um bom resumo pra isso tudo é que um escritor, em geral, é um leitor; e um grande escritor, em geral, é um grande leitor. O leitor vem sempre antes do escritor e tudo o que ele gosta, não gosta, admira, vai se manifestar no escritor.

CLL - Tens presença on-line, possuindo mais de um blog, onde tens conversas com o "Suposto leitor". Consideras importante o escritor contemporâneo se utilizar das possibilidades de divulgação que a internet fornece?

R: Acho que isso pede dois jeitos de olhar a pergunta: um é o seguinte: se estar na internet é importante pra produção, pra arte, pra escrita de um escritor, pro trabalho dele, não. Não é. Alguns dos meus escritores favoritos não tem blogues, facebooks e assemelhados.

Agora, se se está falando sobre a profissão escritor, a carreira literária, penso que a internet é importante como meio de exposição, de divulgação, de contato, de alcance a mais leitores e também de troca com leitores e escritores. Dizem, que nos tempos de outrora, a literatura tinha um grande espaço em jornais, né? Pois nessa época, era importante pra um autor estar nos jornais. Hoje, a literatura – e qualquer coisa – tem espaço na internet, então é claro que é bom estar lá.

Mas, assim, também não sei se é fundamental, né?
Como eu disse antes, por exemplo, Gonçalo M. Tavares não tem um espaço seu na internet. Nem o Amílcar Bettega Barabosa. Não são blogueiros. Nem o Altair Martins. Mas por força do seu talento, da sua literatura, são convidados pra escrever na internet (O Gonçalo que é um autor de larguíssimo alcance tem um blogue de divulgação, mas é só isso, ele não se manifesta pessoalmente ali).

No meu caso, nem publico ficção no blogue onde eu escrevo. No Por Causa dos Elefantes registro umas ideias sobre qualquer assunto, espécies de crônicas sem a pretensão de livro. Acho que é um jeito de não esquecer e desenvolver um pouco algumas ideias e sustos que a gente toma pro aí. E tem o outro endereço, com o meu nome, que daí eu criei pra quem quiser buscar informações sobre o que eu escrevo, sobre o que eu faço. A internet possibilita. Tem que fazer.

CLL - Desde que foste para Portugal, tens escrito sobre particularidades do povo, diferenças no sentido de certas palavras e outras curiosidades. Tuas experiências em terras lusitanas irão contribuir para um possível novo livro? Se sim, seria no modelo de livro de contos?

R: Pois é, isso é uma das tantas coisas legais de estar por aqui. Estranhar a língua portuguesa é muito legal. Eu pensava bastante sobre isso, sobre a possibilidade de se sentir um pouco estrangeiro na própria língua antes de vir. 

E tô adorando essa possibilidade. Mas tem o outro lado que é também descobrir semelhanças com Portugal e os portugueses, que talvez eu não esteja registrando em nenhum lugar, mas que é tão marcante quanto o diferente. Perceber como a relação ainda é muito profunda, muito mais que um idioma compartilhado. Se isso vai pintar em livro? Não há dúvidas que sim. Uma mudança de país é um troço bastante radical pras ideias, é impossível que não venha pra escrita depois. Isso me parece óbvio. Como vai ser, não tenho a menor ideia. Quer dizer, na verdade, já me ocorreu uma ideia, tenho feito anotações pra ela, mas não sei pra quando é. Até porque, no momento, estou escrevendo um livro novo, que talvez até esteja influenciado pelo meu dia a dia aqui (vai saber), mas que era uma ideia que eu já trouxe de Porto Alegre na mala. Então um livro explicitamente inspirado por Portugal vai esperar na fila das ideias. Mas não tenho dúvida de que alguma coisa vai acontecer.
CLL - És formado em Publicidade e desempenhas a função de redator publicitário. Em que medida essa formação influencia tua produção literária?

R: Sim, antes de vir pra Portugal, trabalhei mais de dez anos como redator publicitário. Olha, tenho certeza de que isso me trouxe uma série de influências. Uma das coisas que me parece mais óbvia e identificável é que, em publicidade, a gente num dia faz um comercial pra vender sandália pra menina de 10 anos e no outro redige uma carta pra divulgar um curso universitário pra 3ª idade e, no mesmo dia, tem que fazer um manifesto do governo pra sei lá o quê. Isso cria uma esquizofrenia narrativa (e um certo controle dela) muito positiva. A gente tem que estar sempre tentando falar de forma autêntica com as mais variadas pessoas. Acredito que os meus narradores (e a minha vontade de tentar novos narradores sempre), criar vozes pra personagens variados nos livros, bebe nessa fonte também. Acho impossível que não. Outra coisa que agência de propaganda (departamento de criação em especial) desenvolve é resistência pra trabalhar e refazer trabalho e não achar que o mundo acaba por isso. E até o contrário, perceber que a hora/esforço dedicada a cada frase, a cada ideia, a cada cena, fazem bem pro trabalho. Não há trabalho, e isso vale pra literatura, que a gente não possa deixar melhor.

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