Entrevista: Daniel Galera

Nascido em São Paulo, o escritor e tradutor literário Daniel Galera cresceu, formou-se e atualmente reside em Porto Alegre, onde continua a trabalhar com traduções e no desenvolvimento de seu novo romance, ainda sem data prevista de lançamento, além de publicar resenhas, ensaios e reportagens e manter sua presença na internet, com  seu tumblr  e twitter. Foi autor precursor na utilização da web para publicar e divulgar seus escritos - e ainda mantém disponível gratuitamente, em seu site pessoal, sua primeira publicação, o livro de contos Dentes Guardados.
Conversamos com o escritor sobre o processo de criação, como foi trabalhar em conjunto com Rafael Coutinho na produção da graphic novel Cachalote e sobre a tradução de livros escritos em língua inglesa.

CLL - Teu último volume publicado, Cachalote (2010), foi uma graphic novel, estilo de HQ que tem ganhado espaço recentemente na produção nacional, desenvolvida em conjunto com Rafael Coutinho. Além das facilidades e dificuldades encontradas numa exposição narrativa auxiliada por ilustrações, quais foram os desafios para um escritor já habituado a trabalhar com tramas expressas apenas por palavras quando passa a trabalhar em conjunto com outro artista numa graphic novel? Houve alguma outra graphic novel que influenciou o modo de contar a história em Cachalote?

A Cachalote foi possível porque houve um grande entrosamento criativo entre eu e o Rafael Coutinho, desenhista do livro. Na verdade, criamos as histórias e personagens em conjunto e ele palpitou no roteiro tanto quanto eu palpitei nos desenhos. Sem essa afinidade acho que teria sido bem mais difícil pra mim fazer um roteiro de HQ. Eu sempre li muitos quadrinhos e tinha uma base de roteiro, mas o Rafa me ensinou muita coisa. A gente se inspirou muito nos quadrinhos europeus adultos, que têm uma veia mais silenciosa e poética, e também em certos filmes e discos. E na hora de escrever tentei incorporar a imagem no processo criativo. Normalmente eu preciso me preocupar em como descrever as coisas, mas com HQs a gente também tem que pensar em como as coisas serão desenhadas e descrever com isso em mente. Foi estimulante, gostei de fazer.

CLL  - Como surge, para ti, a ideia inicial que gera a narrativa de um livro? Precisas de algum ambiente isolado para desenvolver a história ou situações vivenciadas e/ou relatadas ajudam na construção da trama?

As histórias nascem de um processo cumulativo que acontece na minha imaginação e combina experiênca pessoal, outras leituras, impressões do mundo, histórias que escuto ou testemunho, questionamentos íntimos ou intelectuais. De vez em quando uma dessas histórias vai ficando, ganhando corpo, e eu percebo que há algo ali a ser elaborado e talvez narrado. Sinto que há significado potencial naquela ideia específica. E de repente eu tenho um projeto para um conto ou um romance. Minhas ideias quase nunca surgem de uma decisão de escrever algo. Pelo contrário, a escrita é a resposta a um processo que acontece sozinho e está ligado à minha maneira essencial de me relacionar com o mundo. É irrelevante se estou isolado ou não. O isolamento só pode ser necessário na hora do trabalho da escrita propriamente dita, por uma questão de concentração e foco.

CLL - Enquanto estás escrevendo um livro, já tens o direcionamento da história pronto, programado até o final? Durante a escrita, já fizeste alguma alteração na trama que acabou por contribuir para a direção da narrativa?

Gosto de trabalhar com um esboço completo da história. Procuro ter a trama toda imaginada e rascunhada antes de mergulhar na escrita de um romance. É claro que no processo de escrita o planejamento costuma ser bastante modificado. Ideias novas vão surgindo e coisas que pareciam boas na imaginação ficam ridículas quando colocadas no papel. É preciso planejar para começar, mas a história ganha vida ao ser escrita. Os dois momentos são igualmente importantes para o resultado final.

CLL - Já traduziste diversos livros do inglês para o português. Achas que a literatura contemporânea de língua inglesa recebe a devida atenção do público leitor brasileiro? Existe algum livro, ainda não traduzido para o português, que tenhas lido em inglês e desejado traduzir?

A literatura de língua inglesa recebe bastante atenção, sim. Além de ser o idioma dominante do mundo ocidental, os países de língua inglesa têm tradições literárias muito fortes que se mantêm relevantes e se reinventam. E um livro que eu adoraria traduzir e nunca foi publicado no Brasil é o Suttree, do Cormac McCarthy. Seria um desafio enorme, mas gosto tanto do romance que encararia com entusiasmo.

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