Chris Dias: o texto e a imagem

Na última segunda-feira, ocorreu o primeiro encontro da Oficina Literatura Infantil: O que a imagem tem a dizer, com a escritora Chris Dias. Aqui na Coordenação do Livro e Literatura, batemos um papo com ela antes do início da oficina sobre as atividades propostas e o tema de enfoque. Confira:


A relação entre texto e imagem é diferente na literatura infantil do que nos outros gêneros literários?

Acho que sim. Acho que é diferente porque eu entendo o livro ilustrado como um gênero novo dentro da literatura infantil. A imagem e o texto acabam formando uma unidade. Então tem coisas que acabam sendo escritas, tem coisas que são ilustradas e, no final, há a construção de um sentido, que é único. Então eu acho que não dá pra entender a literatura infantil dos livros ilustrados de forma dissociada. Mas, claro, com isso, nem perder a qualidade do texto nem a qualidade da imagem. É essa completude que a gente busca.

Então imagem e texto são complementares?

Isso, é um complementar ao outro. E os dois têm que ser de qualidade, como se vê na produção atual.

Os meios de imagem e texto permitem contar histórias diferentes entre si, mas contribuem para a formação de uma história final, completa, a partir dos dois?

Por isso que acho que está se criando uma nova linguagem. É uma liguagem complementar - híbrida, pela própria natureza, por ter esses dois elementos. Essa linguagem - composta, mas ainda linguagem, amplia o nosso conceito de literatura. O conceito de literatura vai além da palavra.

Uma literatura "plurilingual"?

(Risos). "Plurilingual", isso mesmo.

Pro escritor de literatura infantil, escrever já tendo em mente uma maneira de representar as palavras visualmente é uma das qualidades mais importantes?

Acho que o escritor só tem a ganhar se ele fizer isso, mesmo que ele não vá ilustrar. Acredito em parcerias - assim como o texto é uma unidade, a produção desse texto deveria ser também. No momento em que o escritor pensa a história, pensa o seu texto, ele pensa visualmente também, mesmo que ele não seja o produtor dessa visualidade.

O texto é uma espécie de tradução das imagens pensadas pelo escritor...

Sim. E isso é um novo jeito de pensar, me parece. Até acho que os ilustradores estão mais ligados nisso do que os escritores. A minha proposta - não sou ilustradora - é ampliar essa noção para os escritores, pra quem está produzindo a palavra, também - essa palavra híbrida.

A tua oficina é uma maneira de esclarecer essa liguagem pros escritores?

Não acredito em "esclarecimento teórico". Acho que a gente tem que colocar a mão na massa. Então, na verdade, a oficina tem uma proposta completamente prática. A gente vai refletir sobre isso lá pelas tantas, mas fazendo, o tempo inteiro.

Criança "compra" livro pelo texto?

Tem um problema que tá dentro do "Estatuto da Literatura Infantil": criança não compra livro. Essa escolha é feita pelo adulto. O problema do escritor é fazer um projeto literário. Se ele vai ser vendável, isso é problema da editora, da distribuidora, do livreiro. O autor tem que se voltar pro projeto literário, mesmo que ele seja um encalhe - isso é um problema do mercado, não da atuação do escritor. Mas um produto no mercado, seja o que for, vai vender pro adulto. Mesmo que a criança escolha um livro, aquele livro esta à venda por que o livreiro - um adulto, o escolheu para colocar à venda. Outro selecionou para ficar na estante. Acho que o primeiro leitor, mesmo de literatura infantil, é sempre um adulto. E isso é intransponível. É uma pena, mas é intransponível.

Para ti, enquanto escritora de literatura infantil, qual é o maior desafio e qual a maior recompensa?

Maior desafio: criar uma linguagem que seja identificável. Por exemplo, um bom poeta... a gente lê um texto dele e sabe: "este é do Mário Quintana; este é do Manoel de Barros, sabe? Esta só pode ser a Adélia Prado". Acho que a grande dificuldade do escritor de forma geral, e é uma preocupação minha, é que o texto tenha uma linguagem forte a ponto de ser identificado em qualquer condição. Que é algo que a imagem consegue mais facilmente do que o texto. O traço de um ilustrador é mais facilmente identificado do que o texto de um escritor. 

E acho que a principal recompensa é uma criança contar a história da gente longe do livro. (Risos). Essa é a principal recompensa. "Olha, adorei aquela história! Quer que eu te conte?" E ela conta a história inteira... E daí já é uma outra história, contada de um outro modo... Entra no repertório da criança, e isso é muito legal.

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