Entrevista: Renato Zwick


Como você já deve saber, o livro Aforismos, de Karl Kraus, é um dos finalistas do Prêmio Açorianos de Literatura 2011. Por isso, batemos um papo com o organizador e tradutor do volume, Renato Zwick. 

Na entrevista abaixo ele fala sobre os problemas que enfrentou durante o processo de tradução e se faz sentido hoje criar aforismos:

Os aforismos de Karl Kraus encontram sua força no poder da síntese, criando máximas com grande poder de definição em busca de uma reflexão profunda por parte do leitor. Enquanto tradutor, o texto de Kraus foi problemático para trabalhar, devido aos muitos sentidos expressos com poucas frases?
Problemático é pouco; lembro de aforismos que passaram por seis ou sete versões até receber a redação “definitiva“... As dificuldades que o texto de Kraus oferece à tradução são dos mais variados tipos: duplos e triplos sentidos, jogos com expressões idiomáticas e chavões, alusões crípticas etc. Mas, por outro lado, foi a tradução que mais gostei de fazer até agora; me diverti bastante.

O trabalho de seleção dos aforismos levou em conta a atemporalidade das constatações? Há, ainda assim, frases que se encaixam mais perfeitamente dentro do panorama cultural da época em que foram escritas?
Sim e sim. O primeiro ponto, na verdade, foi facilitado pela própria postura do autor, que pode ser resumida no que ele chama de “eternizar o dia”. A concisão do aforismo repousa em grande parte na eliminação de todo e qualquer indício das circunstâncias que lhe deram origem. Assim, quando fala da “mulher”, do “caixeiro” ou do “jornalista”, Kraus talvez tivesse em mente mulheres, caixeiros e jornalistas específicos, mas quando eles deixam de ser indivíduos e, graças à metamorfose aforística, passam a ser “tipos”, podemos reencontrá-los em outras épocas e outros lugares. Quanto aos aforismos ligados mais de perto ao lugar e à época em que foram escritos (mas que mesmo assim, me parece, vale a pena conhecer aqui e agora), o glossário no final do volume presta alguma ajuda.

O aforismo caiu em desuso? Se sim, seria devido à problemática da audácia do escritor em denunciar verdades (ou meias-verdade; ou uma verdade e meia) ou à dificuldade do observador social contemporâneo em captar 'verdades' para denunciar?
Acho que não se pode dizer que o aforismo caiu em desuso; traduções talvez sejam uma prova de que ele continua vivo, legível e afiado. Por outro lado, não saberia indicar pelo menos cinco nomes, digamos, que o pratiquem com desenvoltura atualmente. Embora, considerando a atemporalidade própria do bom aforismo, isso talvez não importe tanto assim. Temos aí o exemplo de Georg Christoph Lichtenberg, iluminista alemão do século XVIII que pouco se preocupou em publicar durante sua vida (e que, aliás, muito influenciou Kraus). Sobre “denunciar ‘verdades’”, talvez não faltem propriamente audácia nem capacidade de percepção. O problema é que a indignação normalmente obscurece (e muitas vezes com razão) a capacidade de fazê-lo sem perder o senso da forma. Denunciar é fácil; difícil é fazê-lo com talento. Isso sem falar no labirinto de dilemas em que cai o autor que faz da denúncia seu ofício. O mais elementar desses dilemas é que ele vive da miséria que denuncia; se ela acabar, ele acaba também. Além disso, cabe considerar que no caso de Kraus temos uma situação única: ele não só tinha talento, mas também tinha a independência econômica para publicar seu próprio jornal. Não sei se existem lá muitos jornalistas, mesmo em tempos de internet, que possam dizer que falam em seus próprios nomes - que não sejam representantes seja lá de quem for – e ainda consigam fazê-lo brilhantemente.

Comentários

  1. trabalho na editora edipro e gostaria de contatar o Renato Zwick para tradução de uma obra. Alguem poderia me passar o contato dele? desde já agradeço. Maira

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