Lexicário - Claudinho Pereira & Rafael Bán Jacobsen
Claudinho Pereira é um dos mais respeitados DJ’s do Rio
Grande do Sul. É autor do livro Na Ponta da Agulha, indicado, agora, como
Melhor Livro do Ano pela Associação Gaúcha de Escritores (AGES).
As palavras de Claudinho fazem parte do Lexicário desta
semana.
CLL - De qual palavra da língua portuguesa tu mais gostas?
Claudinho Pereira - Para mim, a palavra Saudade não tem igual no mundo, em
sentido, em significado e força.
Sempre me pergunto qual a origem da palavra Saudade. Seria
do latim(solitate) do Árabe(Saudah) ou dos arcaísmos (soydade,suydade). Só sei
que Saudade é um sentimento que deve existir no coração de todos
CLL - Qual palavra tu não gostas? Que te doa os ouvidos?
CP - A palavra Diarreia é um horror, doí no ouvido e na barriga.
CLL - E qual palavra tu achas que deveria ser resgatada? (no
sentido de expressão antiga que deixou de ser usada publicamente)
CP - Gosto muito em todos os sentidos da palavra Acepipes.
Pequeno prato salgados também conhecidos por Canapés, que são servidos com aperitivos consoante em caráter íntimo ou em
reuniões e cerimoniais
***
Rafael Bán Jacobsen é professor, físico da UFRGS, pianista e
escritor. É autor de Tempos & Costumes e de Solenar (ambos livros
agraciados com o Prêmio Açorianos de Literatura) e também de Uma leve simetria
(finalista do Prêmio Açorianos de Literatura e do Prêmio Livro do Ano da
Associação Gaúcha de Escritores). O projeto de seu romance Imemorial das pedras
(ainda inédito) foi contemplado com a Bolsa Funarte de Criação Literária.
CLL - De qual palavra da língua portuguesa tu mais gostas?
Rafael Bán Jacobsen - Tenho uma relação de amor e ódio com as palavras, e talvez
ninguém melhor do que Clarice Lispector, em "Água Viva", tenha
conseguido expressar o que sinto em relação a elas: "escrever é o modo de
quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando
essa não-palavra - a entrelinha - morde a isca, alguma coisa se escreveu. Uma
vez que se pescou a entrelinha, poder-se-ia com alívio jogar a palavra
fora." Assim é difícil escolher uma palavra, mas, frente ao desafio,
optaria por uma palavra que traz em si essa ambição de querer dizer muito, de
pescar muitas verdades, de apreender múltiplos sentidos: é a palavra
"simetria", que afirma a busca humana por padrões e ordem em meio ao
caos, guiando nosso pensamento nas mais diferentes áreas (na geometria, na
matemática, na física, na biologia, nas artes em geral e até na literatura em
particular) e, por conseguinte, influenciando na construção da nossa noção de
"belo".
RBJ - Uma que nunca me soa bem é "digladiar", porque,
além de conter o feioso encontro consonantal "gl" e a repetição
"di-di" (que, inevitavelmente, soa infantil), é uma palavra que,
apesar de certa, parece errada. "Degladiar" soaria muito melhor,
ainda que incorreta, enquanto "digladiar" sempre me parece prima da
"mortandela" e do "mindingo".
CLL - E qual palavra tu achas que deveria ser resgatada? (no
sentido de expressão antiga que deixou de ser usada publicamente)
RBJ - São muitas e muitas as palavras que mereceriam ser
revividas. Uma dela é "acepipes", palavra ideal para designar de modo
coletivo e sintético: os docinhos e salgadinhos servidos em festejos (com a
vantagem de não ter esse sufixo diminutivo tolinho); os tira-gostos consumidos
em momentos de lazer (com a vantagem de não ter ares de contrassenso - tirar o
gosto do quê?); os aperitivos ofertados antes de uma refeição (com a vantagem
de distinguir-se naturalmente de alguma bebida alcoolica também oferecida nessa
ocasião); e ainda os antepastos servidos antes do prato principal (com a vantagem
de não provocar reações de humor involuntário ao invocar a imagem de um pasto e
de um bovino se alimentando dele). Enfim: "acepipe" é uma daquelas
palavras extremamente precisas e úteis, um mot juste por excelência.
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