Histórias de patrono

Mas e não é que chegou o dia de abertura da Feira do Livro de Porto Alegre? E, bah, numa sexta-feira dessas, vai ser difícil arrumar um programa melhor do que dar uma passeada pela Praça da Alfândega, pelo Cais do Porto, pelo Memorial do Rio Grande do Sul, enfim, por todos os lugares em que a Feira estiver rolando (uma boa também é fazer uma visita à página com a programação e ir se organizando).


Nesse começo de festa, nada melhor do que conversar com os anfitriões, certo? Pois foi o que fizemos. Quarta passada, falamos com a patrona da edição deste ano, Jane Tutikian, e com o da edição de 2007, Antônio Hohlfeldt. Na entrevista, eles nos contaram como foi (no caso de Jane, como é) a experiência de desempenhar esse papel tão importante num dos principais eventos da cidade.



Jane chegou na Coordenação do Livro parecendo bastante atarefada, tentando dar conta de várias ligações no celular. "É muita entrevista. Desde a nomeação, acho que fiquei numa média de três entrevistas por dia." 


Parece uma estimativa otimista, a julgar pelas últimas semanas: Jane foi capa do caderno Donna, do jornal Zero Hora, e figurou em praticamente todas as publicações impressas do estado. "O mais impressionante é como tem jornal que eu desconhecia -- tem jornal do trem, jornal do bairro...", ela brinca. 


Pelo jeito, Hohlfeldt, que havia chegado um pouco antes, não parecia surpreso: "Viu? Eu te avisei que ia ser assim..."


Mesmo em meio a essa bateria de entrevistas, Jane acredita que está conseguindo desempenhar o papel de patrona. "Acho que a gente tem como responsabilidade ser o anfitrião, ser o embaixador do evento. E é o que estou fazendo." Além disso, ela está se dedicando a projetos de formação do leitor, "dentro do universo da literatura infantil e infanto-juvenil".


Esses projetos sociais parecem ser uma constante para os patronos, e muitas vezes são idealizados pelos próprios. Hohlfeldt, por exemplo, afirma que cada novo eleito tem liberdade para apresentar ideias: "A gente conversa com o pessoal da Câmara [Rio-Grandense do Livro, responsável pela organização da Feira]. Sabe, tem coisas obrigatórias: tu tens que estar na inauguração, tens que dar entrevista. Mas eles também te dão liberdade para propor outros projetos".


Como, por exemplo, a visita à comunidades carentes que Hohfeldt realizou durante sua participação na Feira. "Eu programei uma ida a seis escolas de periferia. Escolas de difícil acesso. Uma ficava quase em Viamão, outra era perto de um presídio -- a escola às vezes servia como rota de fuga dos presos. A maioria delas não tinha nem mesmo condição de articular um ônibus para me levar até o lugar."


Ele se lembra muito claramente da experiência: "Essa, de Viamão, eu acabei passando a tarde inteira lá. E era uma escola de uma miséria, assim, atroz. Mas os professores e os alunos eram sensacionais. Na hora da saída, eu lembro que as crianças se grudaram na minha perna e não me deixaram sair. Era de uma carência descabida. Eles criam laços com muita facilidade."


Jane teve uma experiência parecida, pouco antes de ser eleita patrona: "Teve uma escola de periferia que eu fui visitar, e aí a professora leu em aula um trecho de Alê, Marcelo, Ju e Eu. Depois, ela rasgou o livro e deu três páginas pra cada um. Não tinha livro pra todos, então ela teve que fazer isso. Bah, aí eu chorei." Depois, Jane organizou uma doação de vinte e cinco exemplares do livro para a biblioteca da escola.


Voltando ao dia a dia atribulado do patrono, Hohlfeldt já tinha deixado claro: "Olha, não tem como fugir disso pelo que a Jane está passando." Mas também deu a contrapartida: "A melhor parte vai ser quando tu estiveres na Praça da Alfândega e as pessoas vierem te abraçar, dizendo que amam o teu trabalho como se tu fosses diretamente responsável pela Feira." A partir de hoje, Jane vai poder colocar isso à prova.

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